MONTADO EM POEMAS

A minha lira trilha caminhos

Desconhecidos e perigosos

Em serras e montes rochosos

Variantes cheias de espinhos

Mas trago no peito

Um amor de um jeito

Tão delirante e cheio

De tal feitio

Que, líquido, feito um rio

Flui tanto que me deleito

Não tenho carroça nem cavalo

Tenho uns poemas sem arreios

Pra me levarem em devaneios

No meio da vida ou no intervalo

Lágrimas não descem pelo ralo

Viram letras que vertem palavras

Diluídas em incandescente caldo

Da minha paixão, ardentes lavas

VOCAÇÃO

Sou o ombro do teu sono
O abraço da tua preguiça
Certamente a tua delícia
Pelo tanto que mordomo

No fim das contas, somo

Inteiro, entregue, dedicado

Até dormindo, interligado

Em assistência ao teu sono

Busco proteger-te do viés

Quando, indisposta, tu vens

Enfim, esqueces o que tens

Quando lavo os teus pés

Eu não te vejo, mas eu velo

Acontece que fiquei assim

Músico por um violoncelo

Um jardineiro por um jardim

Tenho fé em nosso Senhor

Que fez a mim uma promessa

Além das do Evangelho, essa

Afinal, uma história de amor

Então, se não te vejo, creio

Tenho fé, não tenho pressa

Acho até que tem um rodeio

Sinto cheiro! Que flor é essa?

DEUS TE ABENÇOE

O que eu sempre quis era isso

Ver esse teu lindo e largo sorriso

De quem sente e vive o amor

De quem, enfim, se encontrou

Deus te abençoe

Sê alegre e muito feliz!

Viva esse teu realizado desejo

Que noto toda vez que te vejo

Quando pisca estrela, o teu brilho

Esse teu sorriso entre os cílios

Deus te abençoe

Sê alegre e muito feliz!

Segue com fé a tua vida

Pelo Senhor tão protegida

Vai na vontade de Deus

Que vejo nos olhos teus

Deus te abençoe

Sê alegre e muito feliz!

CANÇÃO GUARDADA

O som que esperou

Em silêncio postal

Na posta-restante

Mantém-se vibrante

Curtido em sol

Em si, em sal

Que ninguém cante

Essa canção guardada

Como canção normal

Lembra que

Quando foi composta

Retalhava o coração

Em postas

Sei que gostas

Agora, já sem paixão

Esquecida da ferida

Que cada nota dava

Com as cordas do violão

Essa canção guardada

É como um vinho bom

É o lento passar de batom

Quando nada urge

Até poeira é rouge

Para a moça no toucador

Lembra quando for tocada

Que ela foi amada

Em silêncio e na paz

Essa canção guardada

Até entrar em cartaz

GOVERNANTES DA BAHIA

Quando o Sol se põe na Bahia
Deixa uma “soldade” à beira mar
Um ardor de pimenta na alegria
Uma noite aquecida pra sonhar

O astro deixa seu rastro, o calor
Deixa a certeza de um novo dia
Porque o Sol que se põe na baía
Pertence ao nosso Fiel Salvador

Essa noite que o Sol nos deixa

É a deixa à nova estreia da Lua

Chega como uma baiana existe

Rodando a brilhante saia branca

Brilhando o samba que desbanca

A densa escuridão que não resiste

Ela reflete o que parece ausente

Na claridade, o parceiro quente

No ovário da madrugada orvalhada

Germina um novo dia a nascer

E ser mais uma manhã ensolarada

Pois pipoca na Bahia o amanhecer

Governa quem lidera, serve de luz

São os dois astros os governantes

Que cuidam da Bahia, a cada instante

Um, de dia; outra, à noite, por Jesus

AGOSTO

Agosto, os encontros
Agosto, aniversários
Agosto, minha esperança
Agosto, mês temerário

Agosto, um feliz dia dos pais

Agosto, ela arrumou um rapaz
Agosto, uma pitada de sal

Agosto, tudo paranormal
Agosto, minha fé fortalece
Agosto, meu amor cresce
Agosto, o bem contra o mal

Agosto, luta interna anormal

Agosto, perdoar é preciso

Agosto, em Setembro fiz isso
Agosto, o amor vivo e virerei
Ao gosto do Senhor, o meu Rei

O SOM DO AROMA

É perceptível o contraste
Ao longo de trastes
Em que achastes de dividir
As vossas cordas aromais
Entre o contralto e o soprano
Vossos timbres e tons teatrais

Sons rosados do sopro lírico
Que soa como voam pássaros
Meio ateniense, meio espartano
Uma alquimia de essências
Exala muito além das ciências
Música clássica em ritmo baiano

Proclama entre grave e agudo
Cantiga doce em vasta coloratura
Não para os olhos, contudo
Gamas colorindo a partitura
Exalam em orquestra olorfônica
Feito balé de chamas na fornalha
O perfume das rosas rosadas

Vosso aroma é canção de amor
Vosso amor soa, portanto, alto
Não em falsete, mas em contralto
Na ópera em que a voz tem olor

TRAÇOS DO AMOR

Tentando enxergar o amor

Faço analogia em paralelo

E vejo um elo

Como laços que prendem
Não com amarras e tranca
Mas feito abraço que afaga

E não larga

Como ao doce, uma criança

Como o elástico, tua trança
Não é flácido, mas fácil

Se quiseres, desata

Mas nunca desanca
No fundo

É o próprio prisioneiro que se ata
E não deixa por nada essa dança

Envolvimento de fitas de seda

Tão macios, quanto leves

Assim, como um cerco de lebres

Ou, em poesia, palavras ledas

Lidas em braille por um cego

Para a visão, a prisão é o céu

Azul anil, um anel de diamante

Para a audição, silêncio gritante

Ao paladar, tem o sabor de mel

Ao tato, parece água corrente

Ao olfato, é de flores o elo

Como um vibrante violoncelo

Na voz é um clamor renitente

O olhar terno de quem ama

Muda tudo, inventa cenários

Arruma o regaço com um laço

E soa como cantam canários

Tentando enxergar o amor

Vejo o laço que não afrouxa

Embora maleável

É constante como rocha

Apesar de palatável

Muitos o temem

Os corações ficam sólidos

Não se espremem

Lágrimas não derramam

Mas açudes enchem

Os corações que amam

POESIA DE OURIVES

Se eu fosse desenhar uma jóia
Faria um brinco para tua orelha
Brincaria de capturar centelhas
Que meu olho olha
E porque se molha

Extrair, no entanto, o vivo fulgor
De uma calorosa e delicada flor
Não basta a busca diamantina
Não farei um brinco
De pedras de garimpo

Pelo quanto meu peito arde
Enquanto busco pérolas no ar
Queimo ouro no forno de perdoar
É preciso peito ardente
Pra fazer esse pingente

Com todo o fogo, toda a queima
Teimo em purificar meus versos
Desprezo os rumores perversos
E aprecio todo o brilho
A jóia é como um filho

Pode ser que ninguém perceba
Quando estiveres andando na rua
Mas a tua orelha não estará nua
Clareia a luz do tema
Geme alto essa gema