sexta-feira, 29 de julho de 2016

RIMAS TRAVESSAS

Podem palavras se aquecerem
Feito ferros no calor de rimas
Deitarem-se em versos belos
Expressarem nossos anelos
E, por vezes, fazerem esgrimas?

Versos rimados não são arrimos
Não sustentam nem edificam
Não complicam nem simplificam
Deles não dependem os amores
Mas encantam com o que rimam

Não concentremos, doce amada
Nosso amor no som das rimas
Festejemos mais o que rimos
O que rimamos, guardemos
Contra a correnteza, rememos

Convém, contudo, não prescindir
Do que em tudo vê formosuras
Saibamos sempre distinguir
Busquemos os risos e as rimas
Em travesseiros, travessuras

domingo, 24 de julho de 2016

O NOVO MUNDO DO MORIBUNDO

Quando eu andava triste
Havia uma densa camada de ar
Pesando sobre mim, em riste
Uma nuvem de desgosto
Não havia satisfação em nada
Era ainda mais triste o rosto
E cinza, as cinzas da queimada

Fui salvo pelo meu Senhor
Que, cheio de amor, veio me ajudar
E me animou, e me confortou
Ofereceu-me ombro de consolar

Depois, instigou-me a viver
Corajosamente, sem orgulho
Ensinou-me a andar pela fé
Sem temer qualquer mergulho

Quando recuperei o ímpeto
Ele me trouxe para o equilíbrio
Ensinou-me simplicidade e prudência
Aprovou-me e me chamou de filho

Hoje, digo sobre o ar que me rodeia
Em vez de denso, leve o vejo, devo dizer
Ando como uma lebre, em contentamento
Sinto satisfação em tudo do meu viver

Obrigado, obrigado, meu Deus Salvador
Eu tinha pecados acumulados, sem confessar
Envelhecia com perda de bom amor e de humor
Estava cego e, mais, continuava a errar

O Senhor me devolveu a vida e o gosto
O sabor das coisas, a boa vontade de me doar
Estou novo, de novo, assumi meu posto
E vivo pela tua honra e glória, a trabalhar

quinta-feira, 21 de julho de 2016

SONETO DA INFIDELIDADE

O que queres construir
Sendo tu tão infielmente
Que, se não trais, mentes
Com vendavais de esvair?

Onde pensas que vais
No clima que tu semeias
Quando a cabeça meneia
Com desprezo pela paz?

Se tu não crias um inferno
Bem que demonstra querer
Presa a uma ilusão de saber

Se não é fogo, é inverno
Verte gelo num frio eterno
Talvez não saiba o que ser

quarta-feira, 20 de julho de 2016

ENGARRAFADO

A rua intransitável
Carro a carro, engarrafado
Ouço você cantar, no rádio
É como se abrisse o trânsito
Um movimento quântico
Liberdade do miocárdio

A rua enluarada
Vem a brisa e me alisa
Uma champanhe abrindo
Concreto virando mata
O trânsito não se desata
Mas eu estou lhe ouvindo

A rua toda parada
O tempo passa mais rápido
Mas preso no carro, melhoro
Sua voz me faz um carinho
Sinto-me livre como um vinho
Mesmo engarrafado, eu te olho


DO FORRO AO FORRÓ

Nosso cantinho é bem pequeno
Mas bem que cabe muito tempo
Na medida de nós dois
Cabe hoje, amanhã e depois
Enquanto você não chega
No aconchego, minha nega, minha nega

Eu tô contando os dias
Tô assim, só que eu tô só
Forro a cama com a folhinha
Até dia de feriado
Mas vai virar forró
Uma desforra de dá dó
Será forró forrado
O forro vai virar forró

Chego a forrar nosso aconchego
Mas o meu bucho, forro primeiro
Forro o colchão com o calendário
Antigas páginas do diário
Só pra ver tempo passar
E passa passarinho, a cantar, a cantar

As folhas da espera forram a cama
Mas vai ter desforra, se me ama
Forro a cama com a folhinha
Até dia de feriado
Mas vai virar forró
Uma desforra de dá dó
Será forró forrado
O forro vai virar forró

terça-feira, 19 de julho de 2016

NA SUA SACOLA

Quando vai às compras
O que ela traz que se arranca?
Quantas vitrines desarruma?
Quais os balcões que desbanca?

Quando pisa, tão decidida
Como quem marcha pra guerra
Será que segue a batida?
A frequência cardíaca acelera?

Do que ela enche a sacola
Que parece mudar sua feição?
Será que assaltou sentimentos?
Vai que roubou coração…

Por que se orgulha das joias
Que exibe sobre o vestido?
Não vê que não vencem sua pele?
Não brilham mais que o sorriso

INCONTÁVEIS DIAS

Como contas de um colar
Coladas uma a uma
Num cordão de ouro
Coloridos e cinzas dias se juntam
Colecionados como tesouro

Incontáveis dias, intermináveis anos
Suas diárias gotas de lágrimas
E doses altas de riso, assim se faz oceano
Com o vai e vem insistente de ondas
Contas das voltas que o mundo dá, sem engano

Na vida, só o amor conta sem fazer conta
Pra fazer de conta que as horas não passam
Não contar a aspereza dos dias de espera
Antes, descansar na maciez da confiança
E pesar a leveza da fé que o Amor nos dera

Incontáveis dias de diáspora e alguns foras
De martírio, tortura, saudade, tristeza e solidão
Só Deus e eu sabemos, nunca quis desistir
Mantive a fé, amei a repreensão, aceitei a disciplina
E, no doloroso processo de correção, agradeci

Incontáveis dias, muitos com uma doce brisa
Alguns, no entanto, com ventanias cortantes
Teria perecido, se não fosse comigo o Senhor Jesus
A cada dia, nada me faltou graças ao Mestre e Amigo
Ele me salvou do perigo e me encheu de luz

segunda-feira, 18 de julho de 2016

QUE FLOR É ESTA

Ela é uma floresta densa
De matas virgens, misteriosas
Com grotões e clarões surpreendentes
Onde se sente o aroma puro de rosas

Suas costas com encostas íngremes
E curvas ascendentes, maravilhosas
Ranhuras de costelas impetuosas
Arranham a pele como fazem os lemes

Enigmática e cheia de encantos e cantos
De passarinhos em ninhos quase florais
A brisa suspira por caminhos naturais
Suas cachoeiras se derramam em prantos

Eu tenha tempo de conhecer sua folhagem
De sua sublime e rara beleza, todo o interior
Subir em árvores, contemplar a estiagem
Mergulhar em rios em que ninguém navegou

Feito um bandeirante, fincar bandeira
Brava aventura de um intrépido desbravador
Conhecer suas nuances, conhecê-la inteira
Desde o amanhecer ao seu dormir sonhador

FEITIO DE ESTRADAR

Eu me perco nas tuas curvas
Indo ou vindo, ouvindo o que dizes
Os gemidos dos teus deslizes
Nessas viagens, a sol ou chuva

O desenho do teu corpo de estrada
Com contornos tão macios
Que me turvam em desvarios
Lembram planos de emboscada

Feito o leito suave de um rio
Deite o deleite de deslisar na pista
A paisagem que agrada à vista
Extasiado, atônito, me silencio

Meu prazer é a jornada, não é chegar
Amo vagar, não distraído, mas vadio
Entregando-me inteiro, assim confio
Meu desespero ao teu feitio de me levar

sábado, 16 de julho de 2016

ELEITA AO AMOR

Creio num amor de casal
Casado no cerne, desde a raiz
Eu a procuro, mas já estou ligado
Não ao papel, mas, sim, à atriz

Quem sabe, ela não saiba disso
Vivendo o ego, crendo no script
Presa à matéria, ao compromisso
Mas, se ela me vir, talvez acredite

Quem me disse dela foi o meu Deus
E, aos meus olhos, pareceu perfeita
Mas sinto que sua postura me rejeita

Então, evito vê-la com os olhos meus
Antes, confio no que disse Deus
Pois é pelo Senhor que ela foi eleita

O AMOR NÃO MATA

O homem que arranca uma flor
Ceifa sua vida, cortando a raiz
A pretexto de oferecer a uma bela
Aquela que ganha e se sente feliz

Tem um coração duro, não nota
Não é sensível, pois não sente
Quando dá uma flor, ele mente
Se a matou, sua arrogância arrota

Pois quem ama não mata, morre
Não tem o que dar, doa-se inteiro
Pobre, mesmo que tenha dinheiro

Em suas veias a humildade corre
No gesto de amar, he dies of love
Sacrifica-se pelo amor o jardineiro

sexta-feira, 15 de julho de 2016

NÃO TEMA

Não tema
O tema que eu quero abordar
Nas bordas dos meus conceitos
Aceito você jamais concordar
Nunca me enfezo por ênfase
Indefeso, não sei nem brigar

Não quero gritar
Não grito por ganho
Nem ganho no grito

Se caio no riso
É que acho engraçado
Não lutar pela verdade
Porém, por pura vaidade
Querer demais só ganhar

Não importa, sou seu amigo
Serei seu abrigo, se não se importar
Pois eu não consigo, não ser lenitivo
Em definitivo, não sei não perdoar

PASSARINHOS NÃO PASSARÃO

Quando um passarinho canta
Veja que a miudeza encanta
Filarmônico, nunca atravessa
Nem os grilos nem as cigarras
Nem outras guitarras da floresta

Os passarinhos compõem
Em canto e presença harmônica
Como as flores com suas cores
E o perfume que inspira amores
A boa fragrância, só que sônica

Quando um passarinho pousa
Ao longo de um galho singelo
Parece parte, como flor ou fruto
Forma com o vegetal um forte elo
Na orquestra, instrumento justo

Os passarinhos nos ensinam
Que a humildade brilha em verdade
A integridade nos afina em diapasão
Com genuínos frutos da simplicidade
Teremos com Deus a integração

quinta-feira, 14 de julho de 2016

MADURO ERA VERDE

Assim como o deserto
Favorece a maturação
A dúvida é solo fértil
Em que a fé é plantação

Na aspereza do agreste
O sertanejo se faz forte
Na adversidade, floresce
Esperança contra a morte

A escuridão destaca a luz
A alegria sobrepuja a dor
Adormecia quem desperta
Na castidade, brilha o amor

O maduro um dia foi verde
O adulto já foi criança
Renunciar legitimou querer-te
E assim saber o que não cansa